SETÚBAL - Jardim da Beira Mar (Nossa Senhora do Cais) - Lenda
Nossa Senhora do Cais
SETÚBAL (Jardim da Beira Mar) - 23 de fevereiro de 2018
Reza a lenda que...
“Em cada tarde que descia à praia, dispondo-se a
embarcar para a faina, para lá do rio Sado, o pescador Valentim de Jesus erguia
os olhos.
Erguia os olhos ao seu céu mais azul, a varanda da
casa do palácio de D. Manuel Vaz e Castro, buscando um vulto feminino.
Tratava-se de Ester, a judia com quem o fidalgo casara e por quem o jovem
pescador estava apaixonado.
Bastava vê-la às vezes. Sabia lá o que é que a dama
pensava dele, se acaso o via. Quantas vezes ele a vira, mas houve uma tarde em
que se apaixonara. E levava sempre consigo, para o mar, aquela lembrança de
beleza.
Ora o pai de Valentim logo reparou que o filho fora
apanhado nas redes do amor. O rapaz confessou-lhe, então o que se passava. E o
velho apenas disse:
- Esquece-a! Olha que o fidalgo não é para
brincadeiras!
Mas Valentim explicou que, apesar de todo o amor dele
por Ester, ela nem sabia que ele existia.
- Isso não
interessa! Repara mas é nas raparigas que estão de olho em ti e escolhe a que
mais te agradar! Essas, sim, são para o teu dente!
Azedou-se a discussão, distanciaram-se pai e filho.
Ora, uma bela tarde, estando Ester na varanda do seu
palácio, em Setúbal, perto do rio, reparou que o pescador nesse dia ainda não
tinha passado e surpreendeu-se por pensar nisso. É que lhe doía mesmo aquela
ausência. Nunca falara com ele e julgava nem sequer ter dado pela sua
existência e, no entanto, sentia-lhe a falta. Sabia lá quem ele era, que feitio
teria! Andava o marido na guerra e ela com aqueles pensamentos tão tolos!
Pelos sinais, via-se que o dia seguinte seria
soalheiro e calmo e então…então sorrir-lhe-ia quando ele passasse. Afinal
lembrava-se dos olhos dele, tão ternos, envolvendo-a a ela que, por ser judia,
era desmerecida pelos demais.
E no dia seguinte, Ester e Valentim sorriram um ao
outro e assim todas as tardes seguintes.
O velho receava que as vozes dessem disso notícia ao
fidalgo.
Numa tarde, aconteceu Valentim sair para o mar,
levando consigo o sorriso de Ester. Deu uma volta, mas amarrou de novo o barco
e subiu à varanda. A judia não esperava tamanha audácia e assustou-se. Valentim
disse-lhe que apenas a queria ver mais de perto e falar-lhe, tocar-lhe as mãos.
Ela mandava-o embora, tanto mais que o marido regressara da guerra, na véspera.
O pescador declarou-se, mas ela tremia de medo e tinha
razões para isso, porque apareceu D. Manuel que, vendo o que se passava,
desembainhou a espada e matou o homem, atirando o corpo ao rio. À mulher,
mandou-a para um convento.
E o velho pescador não mais perdoou a Ester, pela atração
exercida sobre o filho. Nem um milagre o faria acreditar noutra coisa, garantia
ele.
E uma tarde, discutindo os pescadores na praia, num
gesto violento, a imagem de Nossa Senhora do Cais foi parar à água lançando-se
o velho a buscá-la a nado. Quando regressou com ela ao areal, quase
enlouquecia. O rosto da imagem era o da judia Ester a quem ele ia insultar ao
parlatório do convento. Assim, quem em Setúbal hoje procurar a imagem de Nossa
Senhora do Cais, terá oportunidade de conhecer o rosto de Ester, a paixão do
pescador Valentim.”
Texto
capturado em 24 de fevereiro de 2018 de: http://setubalcidadedorioazul.blogspot.pt/2011/11/beira-mar.html
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