Sinos de Taizé –
Agosto, 1999
"Três
vezes por dia, tudo pára na colina de Taizé: o trabalho, os estudos bíblicos,
os intercâmbios. Os sinos chamam à igreja para rezar. Centenas, por vezes
milhares de jovens de países muito diversos através do mundo, rezam e cantam
com os irmãos da Comunidade. A Bíblia é lida em várias línguas. No centro de
cada oração comunitária, um longo tempo de silêncio é um momento único de
encontro com Deus. Silêncio
e oração Se
nos deixarmos guiar pelo mais antigo livro de oração, os Salmos bíblicos, nós
encontramos aí duas formas principais de oração: por um lado o lamento e o
pedido de socorro, por outro o agradecimento e o louvor. De forma mais oculta,
há um terceiro tipo de oração, sem súplicas nem louvor explícito. O Salmo 131,
por exemplo, não é senão calma e confiança: «Estou sossegado e tranquilo…
Espera no Senhor, desde agora e para sempre!» Por
vezes a oração cala-se, pois uma comunhão tranquila com Deus pode abster-se de
palavras. «Estou sossegado e tranquilo, como uma criança saciada ao colo da
mãe; a minha alma é como uma criança saciada.» Como uma criança saciada que
parou de gritar, junto da sua mãe, assim pode estar a minha alma na presença de
Deus. Então a oração não precisa de palavras, nem mesmo de reflexões. Como
chegar ao silêncio interior? Por vezes calamo-nos, mas, por dentro, discutimos
muito, confrontando-nos com interlocutores imaginários ou lutando connosco
mesmos. Manter a sua alma em paz pressupõe uma espécie de simplicidade: «Já não
corro atrás de grandezas, ou de coisas fora do meu alcance.» Fazer silêncio é
reconhecer que as minhas inquietações não têm muito poder. Fazer silêncio é
confiar a Deus o que está fora do meu alcance e das minhas capacidades. Um
momento de silêncio, mesmo muito breve, é como um repouso sabático, uma santa
pausa, uma trégua da inquietação. A
agitação dos nossos pensamentos pode ser comparada com a tempestade que sacudiu
o barco dos discípulos, no Mar da Galileia, enquanto Jesus dormia. Também nos
acontece estarmos perdidos, angustiados, incapazes de nos apaziguarmos a nós
mesmos. Mas Cristo também é capaz de vir em nosso auxílio. Da mesma forma que
falou imperiosamente ao vento e ao mar e que «se fez grande calma», ele pode
igualmente acalmar o nosso coração quando está agitado pelo medo e pelas
inquietações (Marcos 4). Fazendo
silêncio, pomos a nossa esperança em Deus. Um salmo sugere que o silêncio é
mesmo uma forma de louvor. Nós lemos habitualmente o primeiro verso do Salmo
65: «A ti, ó Deus, é devido o louvor». Esta tradução segue a versão grega, mas
na verdade o texto hebreu diz: «Para Vós, ó Deus, o silêncio é louvor». Quando
cessam as palavras e os pensamentos, Deus é louvado no enlevo silencioso e na
admiração. A
Palavra de Deus: trovão e silêncio No
Sinai, Deus falou a Moisés e aos Israelitas. Trovões, relâmpagos e um som de
trompa cada vez mais forte, precediam e acompanhavam a Palavra de Deus (Êxodo
19). Séculos mais tarde, o profeta Elias volta à mesma montanha de Deus. Ali
revive a experiência dos seus antepassados: tempestade, tremores de terra e
fogo, e ele prontifica-se a escutar Deus falando-lhe no trovão. Mas o Senhor
não está nos fenómenos tradicionais do seu poder. Quando o grande barulho para,
Elias ouve «o murmúrio de uma brisa suave», e então Deus fala-lhe (1 Reis 19). Deus
fala com voz forte ou numa brisa de silêncio? Temos de tomar como modelo o povo
reunido ao pé do Sinai ou o profeta Elias? Provavelmente isto é uma falsa
alternativa. Os fenómenos terríveis que acompanham o dom dos dez mandamentos
sublinham a sua importância. Guardar os mandamentos ou rejeitá-los é uma
questão de vida ou de morte. Quem vê uma criança correr em direção a um carro
que passa, tem muitas razões para gritar tão alto quanto consiga. Em situações
análogas, os profetas anunciaram a palavra de Deus de forma a fazer zumbir as
orelhas. Palavras
ditas com voz forte fazem-se ouvir, impressionam. Mas sabemos bem que elas
quase não tocam os corações. Em lugar de acolhimento, elas encontram
resistência. A experiência de Elias mostra que Deus não quer impressionar, mas
ser compreendido e acolhido. Deus escolheu «o murmúrio de uma brisa suave» para
falar. É um paradoxo: Deus
é silencioso e no entanto fala Quando
a palavra de Deus se faz «o murmúrio de uma brisa suave», ela é mais eficaz do
que nunca para transformar os nossos corações. A tempestade do monte Sinai
abria fendas nos rochedos, mas a palavra silenciosa de Deus é capaz de quebrar
os corações de pedra. Para o próprio Elias, o silêncio súbito era provavelmente
mais temível do que a tempestade e o trovão. As poderosas manifestações de Deus
eram-lhe, em certo sentido, familiares. É o silêncio de Deus que desconcerta,
porque é muito diferente de tudo o que Elias conhecia até então. O
silêncio prepara-nos para um novo encontro com Deus. No silêncio, a palavra de
Deus pode atingir os recantos escondidos dos nossos corações. No silêncio, ela
revela-se «mais penetrante do que uma espada de dois gumes, penetra até à
divisão da alma e do corpo» (Hebreus 4,12). Fazendo silêncio, deixamos de
esconder-nos diante de Deus, e a luz de Cristo pode atingir, curar e mesmo
transformar aquilo de que temos vergonha. Silêncio
e amor Cristo
diz: «É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei»
(João 15,12). Precisamos de silêncio para acolher estas palavras e pô-las em
prática. Quando estamos agitados e inquietos, temos tantos argumentos e razões
para não perdoar e para não amar facilmente. Mas quando temos «a nossa alma em
paz e silêncio», estas razões desaparecem. Talvez por vezes evitemos o
silêncio, preferindo-lhe qualquer barulho, palavras ou distrações quaisquer que
elas sejam, porque a paz interior é uma questão arriscada: torna-nos vazios e
pobres, dissolve a amargura e as revoltas e leva-nos ao dom de nós mesmos.
Silenciosos e pobres, os nossos corações são conquistados pelo Espírito Santo,
cheios de um amor incondicional. De forma humilde mas certa, o silêncio leva a
amar." Texto
capturado em Março 25, 2013 de http://www.taize.fr/pt_article1720.html
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